sexta-feira, 8 de junho de 2012

A episteme segundo Millôr

Por muito tempo, não sabia o que significava epistemologia. Era apenas uma palavra bonita que ficava a fitar a uma distância regulamentar no meu baú de significados. Primeiro no mestrado, e agora já no doutorado, estou sendo "gentilmente" obrigado a compreender o que quer dizer, tendo em vista o fato de o termo ser utilizado por diversos autores e alguns professores e companheiros de curso.

De acordo com o Michaelis, a epistemologia trata da teoria do conhecimento, tendo a ver com sua origem, natureza e limites. Nesse caso, o conhecimento representa um ponto de confluência entre crenças e verdades. Enquanto a crença está no domínio da opinião e do subjetivo, o conhecimento significa uma crença de outra ordem, verdadeira e justificada, a explicar o mundo que nos rodeia.

Na saúde, a epistemologia hegemônica está relacionada ao saber biomédico, fundado na razão para determinação do mundo. Aos cientistas, cabe observar e analisar a realidade dada para construção do conhecimento que a represente de forma fiel. As doenças, por exemplo, são entidades de existência concreta que se expressam através de sintais e sintomas do organismo, considerados os dados objetivos para a ciência. O advento da medicina clínica, tão bem estudada pelo francês Michel Foucault (1926-1984), explica em parte a epistemologia biomédica de hoje e o conhecimento predominante na saúde.

A cada dia, penso mais nesse tão decantado conhecimento e, à medida que me aproximo do meu objeto de pesquisa, sinto-me afastar dele pelo simples fato de ser um fundo sem fundo o poço que teimo adentrar. Qual o verdadeiro significado do conhecimento em relação ao que busco estudar? E quais os critérios que definem uma verdade socialmente, ainda mais quando ela é encarada como absoluta? Não sei hoje, nem sei se saberei um dia.

Por hora, divirto-me com os ditos do humorista, desenhista, escritor e jornalista Millôr Fernandes (1923-2012). Dias atrás, dando continuidade ao levantamento da minha amostra de pesquisa, encontrei um poema interessante e engraçado dele sobre o conhecimento e a epistemologia. O texto foi publicado na revista Veja de 14 de maio de 1975.


Texto e imagem de  Millôr Fernandes sobre o conhecimento publicados na Veja de 14 de maio de 1975

Como diria Millôr, é difícil mesmo encontrar epistemologia, pois ela está no sujeito e depende única e exclusivamente dele para se desenvolver. Não é algo palpável. Tem a ver com o saber. E, estando na pós-graduação, a ambição ilusória está nos estudos. Por isso mesmo, minha epistemologia particular é a consciência da necessidade de estudar mais. E nada melhor do que os livros para me fazerem entender a perspectiva epistemológica mais ampla posta no meio acadêmico de buscar enriquecer mais e mais a gama de conhecimentos.

Sendo objetos transcendentes de amores tácteis, retomando Caetano Veloso, esses conhecimentos me fazem viajar no/pelo Universo. "Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso. E, sem dúvida, sobretudo o verso, é o que pode lançar mundos no mundo", explica o compositor. Estar, ser e existir: eis a tríade desafiadora do epistemólogo. Será essa a verdadeira metafísica do conhecimento? Longe de mais questões, deixemos os livros adentrarem apontando para a expansão do(s) Universo(s). Quem sabe eu epistemologize na mais pura simplicidade do que posso conhecer para melhor significá-lo.



[ Livros, canção do compositor Caetano Veloso que consta no disco "Livro" (gravadora Universal Music), lançado em 1997 ]

PS: Inicialmente, o texto que constava nesta postagem era um pouco diferente, menor em tamanho e desenvolvimento analítico. Mas, devido à colocação posta pela amiga Tânia Consuelo, resolvi ampliá-lo, buscando explicar um pouco mais o que significa epistemologia. Não sei se consegui ser claro, de fato, mas o exercício me forçou uma reflexão maior sobre o assunto e, curiosamente, me fez compreender melhor o significado do conceito.